sexta-feira, 3 de abril de 2015

Páscoa : Tempo de mudança


Lá no sertão não recebíamos ovos de chocolate...
Era amor e fraternidade o que mais se via por ali.Nos supermercados não havia a tentação dos chocolates, mas a fartura da colheita.Feijão verde, umbus, macaxeira, jerimuns.
Nas calçadas os amigos e familiares se reencontravam, o filho da capital chegava, trazendo alegria e entusiasmo para se comemorar a ressurreição de Cristo.
Lá no sertão não esperávamos o coelho...
Ansiávamos por receber boas esmolas e em todas as casas as famílias davam o que de melhor tinham colhido na chuva descida do céu.
Era um ritual! Íamos de porta em porta.-Me dá uma esmolinha pra mamãe jejuar? O engraçado é que se for pensar, jejum se faz sem de pão se alimentar, e nós, as muitas crianças, pedíamos em todos os lares um prato de comida, um pão, um pouco de feijão, o que de mais grato, as senhoras e homens do campo nos quisesse ofertar.
No sertão os pais separavam em molhos o feijão para os compadres, e nós os afilhados íamos felizes entregar como esmola àqueles que nos apresentara a Deus.A uns entregava batatas, outros feijão, outros mandioca, outros o que mais Deus e os todos os santos nos tivesse doado no ano de tempo bom.
Eram tantas as esmolas, mas esmola no sentido de oferta e gratidão para aqueles que eram segundo pai e segunda mãe. E como tinham compadres e comadres a visitar!
Lá no sertão a fraternidade em almoço de sexta-feira santa era demasiadamente grande, amigos, vizinhos, padrinhos chegados de longe.
E ainda tinha a festa do fazer bolos.Todas as famílias preparavam muitas receitas, bolo de macaxeira, de goma, bolo preto com rapadura, bolo de ovos como eu aprendi a conhecer, de leite e biscoitos, muitos biscoitos postos em muitas formas de lata. 
Era uma verdadeira procissão de mulheres e crianças com formas de variados bolos a levar aos fornos da padaria, e dos quintais da vizinha mais rica.Forno de lenha, feito o puro barro.Lá no sertão não havia disputa, cada forma tinha seu nome, mas todos podiam estar juntos em um mesmo lugar.Forno de lenha, coração de amigos, vizinhos afetuosos, e padrinhos em par.
No sertão de minha infância eu me deliciava com o que recebia de meus padrinhos, um me dava roupas, outro um dinheiro que eu nunca podia receber de meus pais, de outro, sabonetes, perfumes, e balas para adoçar o paladar.
Lá no sertão não tinha ovos de páscoa, tinha a amizade a colorir, não esperávamos o coelho de páscoa, esperávamos os padrinhos e amigos a nos abraçar e fazer rir. Primos, tios, vindo de outras cidades a deixar nossa mesa e coração florir.
Lá no sertão a sexta-feira santa era um dia especial para nós que nos silenciávamos em respeito ao Cristo morto, e não brincávamos no quintal.Só a meia noite do sábado, o riso se fazia perceber, crianças e homens, mulheres e meninos começavam a judiar do Judas traidor feito pelas mãos de um artista inventor, que todas nele as mazelas queriam descontar: o que fez ao cristo, o que fez a nós em traição, pois ele representava o mal.E assim malhávamos o pobre Judas até que o fato estivesse consumado.
Lá no sertão a páscoa era diferente, um misto de amor e esperança, de alegria e gratidão, de conversas demoradas ao pé da rede, esperando a salvação:Domingo de páscoa, o sino tocando chamando a todos pra celebração.
E assim éramos felizes em meio á gente simples que pensava mais em Deus.Livre do consumismo desenfreado eu cresci e hoje aprendi e pude encontrar na cultura e na religião , sob a luz da bíblia: Cristo não está mais morto e em todo tempo se mostra vivo a nos amar.


 Que possamos refletir sobre este tempo em nossa vida e que mudança ele trás em nós, se apenas material, ou que o Cristo verdadeiramente ressurreto viva em nós e seja a mudança precisa todos os dias 
Paula Belmino

Um comentário:

Anônimo disse...

Que beleza a simplicidade do sentimento sertanejo. E como é bom resgatar esse sentimento simples e ensinar às filhas, ao menos um pouco da simplicidade que parece ir ficando para trás. Beijo! Renata e Laura