domingo, 5 de junho de 2022

Cheiro de infância





  Quando quero voltar meu tempo de menina, recorro aos cheiros,  aos perfumes da infância,  cada fragrância da simplicidade,  cada ternura guardada nos aromas da casa, e do quintal onde cresci. 

   Minha infância tinha cheiro de tempero, das plantas da horta suspensa feita com lascas de madeira  e adubo, ou numa bacia velha de zinco que quando furada ganhava a serventia de produzir ervas.  

  Ali na horta,  minha avó depositava sementes de coentro, pequenos grãos que ora virariam chás para dor de cabeça  e problemas comuns da mulher, e para outras mazelas do corpo, ora serviriam  para replantar, e quando brotavam, os talos de coentro cortados perfumariam caldos  de feijão, a sopa, o pirão batido, e até a farofa d'água, e podiam até, ganhar poder de curar mal olhado nas suas rezas e benzedeiras.

   Minha infância tem cheiro de coentro em flor que na singeleza do nosso quintal convidava borboletas e besouros para brincar e fazer festa, pois quando estávamos no quintal, eu e minha avó a cuidar da horta, as flores brancas do coentro  já maduro florescidas e prontas para serem replantadas eram  colhidas, e delas novas sementes iam ao sol, ou ardiam e exalavam perfume na boca da minha avó temperando suas palavras de vida. 

   Já as florzinhas brancas iam das mãos dela aos meus cabelos, ou para o altar do santinho, junto  com as folhas verdes do coentro misturadas à terra, que tornavam sagradas as mãos   que me abençoavam e me conduziam. 

   Tem cheiro de coentro minha infância,  no cuidar, no falar, no alimentar. Cheira a coentro minha memória afetiva, minha criança. E permanece, ainda hoje, quando saboreado o coentro,  em meu paladar, se pode provar o tempero, o sabor e o cheiro do amor.


Paula Belmino

3 comentários:

- R y k @ r d o - disse...

Também gosto de passear pelos campos recordando a minha infância. Nasci no campo entre flores e árvores.
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Feliz domingo.
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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chica disse...

Que lindo e todos temos esses cheiros que nos remetem à infância! Adorei! beijos, chica

Lar & Linho disse...

São cheiros que nos movem continuamente. Muito bonita poesia!

Beijo!

Renata